Peliano costuma brincar que a poes-ia e foram os poetas que a trouxeram de volta! Uma de suas invenções mais ricas é conseguir por em palavras lirismos maravilhosos, aqueles que percebemos de repente e temos a impressão que não vamos conseguir exprimi-los. Exemplos: de Manoel de Barros -"Deixamos Bernardo de manhã em sua sepultura. De tarde o deserto já estava em nós"; de Ernesto Sabato - "Sólo quienes sean capaces de encarnar la utopía serán aptos para ... recuperar cuanto de humanidad hayamos perdido"; de Thiago de Mello - "Faz escuro mas eu canto"; de Helen Keller - "Nunca se deve engatinhar quando o impulso é voar"; de Millôr Fernandes - "Sim, do mundo nada se leva. Mas é formidável ter uma porção de coisas a que dizer adeus". É como teria exclamado Michelangelo que não fora ele quem esculpiu Davi, pois este já estava pronto dentro da pedra, Michelangelo apenas tirara-o de lá. Então, para Peliano, o lirismo é quando nos abraça o mundo fora de nós, cochicha seu mistério em nossos ouvidos e o pegamos com as mãos da poesia em seus muitos dedos de expressão.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Ronaldo Cagiano

Recompensa
A manhã e seus tropeços
a tarde e seus cansaços,
                              resíduos de um velho dia.

Na noite, os meus abraços
entre seus braços
                              de farta coreogragia.

Mosaico

Não me importa o que sou.
De nada vale a pena
deslumbrar-se
na vã tentativa de admirar
o que fez, o que foi, o que tem.
Orgulho-me, sim,
daquilo que não fui.

Só assim consigo estar mais leve
e ver além do sol,
porque das decepções que não sofri
e das frustações que não tive
a mim e aos demais poupei.

Entre tantas despedidas,
amizades desfeitas ou amores inconclusos,
ficou-me a estrada
e a estranha, iniludível sensação
de estar inacabado.

Contraponto

No parapeito
da velha ponte de Cataguases
esta água em que me dispo:
espelho do que fui.

Da palavra

(In) tento alinhavar a palavra
                       retesar da pena
                       à procura do verso.

Enquanto isso,
incursão no sulco que a pa-
                                            lavra submersa e insubmissa.

Seu reverso me ilude
                        poesia esquiva

Perverso, o verbo desencontra o percurso
e no recurso,
                                               fatigado,
cobiça o limiar do poema.

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