Peliano costuma brincar que a poes-ia e foram os poetas que a trouxeram de volta! Uma de suas invenções mais ricas é conseguir por em palavras lirismos maravilhosos, aqueles que percebemos de repente e temos a impressão que não vamos conseguir exprimi-los. Exemplos: de Manoel de Barros -"Deixamos Bernardo de manhã em sua sepultura. De tarde o deserto já estava em nós"; de Ernesto Sabato - "Sólo quienes sean capaces de encarnar la utopía serán aptos para ... recuperar cuanto de humanidad hayamos perdido"; de Thiago de Mello - "Faz escuro mas eu canto"; de Helen Keller - "Nunca se deve engatinhar quando o impulso é voar"; de Millôr Fernandes - "Sim, do mundo nada se leva. Mas é formidável ter uma porção de coisas a que dizer adeus". É como teria exclamado Michelangelo que não fora ele quem esculpiu Davi, pois este já estava pronto dentro da pedra, Michelangelo apenas tirara-o de lá. Então, para Peliano, o lirismo é quando nos abraça o mundo fora de nós, cochicha seu mistério em nossos ouvidos e o pegamos com as mãos da poesia em seus muitos dedos de expressão.

sexta-feira, 30 de março de 2012

José Godoy Garcia

Minha mão se fosse a sua minha lembrança...

Minha mão se fosse a sua minha lembrança
meu corpo se fosse o seu me olhava.
Minha tristeza sua se fosse a minha
minha tristeza me cantava, minha mão
se fosse a nuvem me chovia,
minha carne se fosse a do tigre
me devorava, ela devora, ela,
devora todo dia o meu sonho.
Mas antes, a carne de meu sonho
fica no varal e eu como, meu pé
caminha e sabe bem quem leva,
meu pé leva a Neurália o pó
que apanha nas estradas, um pó
que poderia contar histórias
de meu chão, uma manta de carne
no varal do mundo pra me comer!
O meu sonho no varal fica só osso.

Estrelas Acorrentadas

As estrelas acorrentadas
nas águas dos rios
comeram os dentes de Deus
As estrelas acorrentadas
nas águas dos rios
– mas se é em agosto, em Goiás
as águas dos rios estão vermelhas
– águas dependuradas
no gancho das estrelas no céu
– mas se é em agosto em Goiás
as águas dos rios estão vermelhas
– no chão balouçante
– céu, chapéu de Deus.

Há no rio um

certo ar de indiferença
ao passar do menino. Deixava livre
o medo, o terror, o assombro no largo
espraiado e bravio ou no vertiginoso
cachoar flamejante dos estreitos.
O menino queria dissimular-se
como segurando num ponto de apoio,
não bem olhava a correnteza, já o velho,
muito moroso, se deixava ficar atrás,
amigo do rio.
Ainda longe, o menino caminhava cansado
e com o rio em si, sentindo-o qual
uma lenda que não sairia de sua mente,
no passar da vida e no passar
dos rios do mundo.

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