Peliano costuma brincar que a poes-ia e foram os poetas que a trouxeram de volta! Uma de suas invenções mais ricas é conseguir por em palavras lirismos maravilhosos, aqueles que percebemos de repente e temos a impressão que não vamos conseguir exprimi-los. Exemplos: de Manoel de Barros -"Deixamos Bernardo de manhã em sua sepultura. De tarde o deserto já estava em nós"; de Ernesto Sabato - "Sólo quienes sean capaces de encarnar la utopía serán aptos para ... recuperar cuanto de humanidad hayamos perdido"; de Thiago de Mello - "Faz escuro mas eu canto"; de Helen Keller - "Nunca se deve engatinhar quando o impulso é voar"; de Millôr Fernandes - "Sim, do mundo nada se leva. Mas é formidável ter uma porção de coisas a que dizer adeus". É como teria exclamado Michelangelo que não fora ele quem esculpiu Davi, pois este já estava pronto dentro da pedra, Michelangelo apenas tirara-o de lá. Então, para Peliano, o lirismo é quando nos abraça o mundo fora de nós, cochicha seu mistério em nossos ouvidos e o pegamos com as mãos da poesia em seus muitos dedos de expressão.

domingo, 20 de maio de 2012

Antonio Miranda

Adeus

Que seja com um machado.
Prefiro uma lâmina aguda
um simples martelo
num golpe de misericórdia.

Com palavras, não.
Elas ferem muito mais
penetram mais ainda
mais fundo.


Nada de desculpas
de explicações.


De um só golpe
certeiro
definitivo.


Se não,
saia em silêncio.

Apague a luz.
...

Maturidade
 
Eu sou um privilegiado
e nem percebia:
vivo a minha fantasia.
Tenho tanto
em tão pouco
mas não me basto
no pleno usufruto
do qu'eu queria.

Buriti

Árvore da vida.
Solene,
solitária, solidária.

Nas entranhas da terra e
em cúpula celeste:
ramificações estranhas,
demarcando várzeas
celebrando oásis
matinais.

Óleo e copa,
alimento e proteção de vida.

Das entranhas da terra
ao firmamento,
uma simetria de volumes
invertidos: no espaço aberto
e no solo contido,
ampulheta de vida.

Buritizais descendo geografias
aquáticas
no roteiro dos pássaros
e tropeiros.

Escamas
córneas lustrosas
avermelhadas.

Não se sabe se é a palmeira
que passa ou o tropeiro
que fica.

Testemunhas silentes
mas não indiferentes
pois o buriti é dadivoso
umbrátil
altaneiro.

Enquanto houver buritizais
enquanto houver mananciais
enquanto houver chuvas
lodaçais
enquanto
e portanto
o milagre da existência,
entretanto
vida e pranto.
 
Confissão

Tenho inveja, confesso,
de quem pode verter a sua dor
em plangentes versos de amor,
de quem explode em doce envide.
Tenho inveja de quem clama,
ama e se proclama sempre
em nome de um deus,
de quem tem a fé
que eu nunca tive.
inveja de quem entra em desespero
e suicida por alguém
que lhe não correspondia;
enquanto eu, mesmo feliz
no relacionamento mais duradouro
vivo sempre o último momento,
todo dia.

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