Peliano costuma brincar que a poes-ia e foram os poetas que a trouxeram de volta! Uma de suas invenções mais ricas é conseguir por em palavras lirismos maravilhosos, aqueles que percebemos de repente e temos a impressão que não vamos conseguir exprimi-los. Exemplos: de Manoel de Barros -"Deixamos Bernardo de manhã em sua sepultura. De tarde o deserto já estava em nós"; de Ernesto Sabato - "Sólo quienes sean capaces de encarnar la utopía serán aptos para ... recuperar cuanto de humanidad hayamos perdido"; de Thiago de Mello - "Faz escuro mas eu canto"; de Helen Keller - "Nunca se deve engatinhar quando o impulso é voar"; de Millôr Fernandes - "Sim, do mundo nada se leva. Mas é formidável ter uma porção de coisas a que dizer adeus". É como teria exclamado Michelangelo que não fora ele quem esculpiu Davi, pois este já estava pronto dentro da pedra, Michelangelo apenas tirara-o de lá. Então, para Peliano, o lirismo é quando nos abraça o mundo fora de nós, cochicha seu mistério em nossos ouvidos e o pegamos com as mãos da poesia em seus muitos dedos de expressão.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Nei Duclós


Chave

Do planeta gelo tens a chave
onde me confinas, alma rude
do carinho que dou és ataúde
devolves paralelas e quadrados

Se fosse apenas a secura
de um coração que não reage
mas é corrente sem futuro
pacto de solidão para viagem

Deveria escapar dessa armadilha
que acaba de vez com minha saúde
mas fico na esperança da aspirina

O mais duro é que te comprazes
em dizer não quando digo abre
Perdes a chance de ser só doçura

Sombra

Sinto medo do amor, jogo de luzes
que leva teus bens, arca de breu
flores confusas em vaso de nuvem
presentes inúteis, roupas sem uso

Pura solidão, coração que tortura
Perda que nunca refaz o caminho
Muda sua vida ou joga no fundo?
Ramo de espinho em som submisso

Tremo de dor quando te aproximas
pois sei que esse abraço acha seu fim
no rastro que deixo na dobra do corpo

Eu erro por vício, sem haver sintonia
entre tua glória e o meu desconforto
na sombra do lado onde vivo sozinho

Pólvora

Não tenho piedade, coração solitário
meu trato contigo não inclui recato
faço o serviço, jogamos no mato
de comum acordo, couro de gata

Preferes assim, flor confiscada
evitas a dor, tentadora do hábito
em vez do rodízio, rotina de valsa
enlaças o tango, rasgo de aposta

Propões desacato e eu me convenço
só que no fundo conheço tua lábia
é pura armadilha em cima do escravo

És dona do mundo e nada te importa
sabes que sou o mel que devotas
dentro de ti, inventora da pólvora

Corrente
 

Vai embora já que não se segura
prefere distância ao som da corrente
me quer muito mas não me procura
como entender o apronto da fuga?

Quer evitar o assombro do grude
provocado pela grossa doçura
aos sair do sério em tarde impura
Sumiu, pois você bem se conhece

Me exclui como se eu fosse bicho
mantém fechada a jaula da impostura
onde me cerco de ansiedade e lixo

Rosno na grade sem alimentar o vício
pelo vestido longo que rasguei um dia
Me dá gastura pois fui só o exercício

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